Meu filho é muito inteligente...mas não vai bem na escola!

por Fátima Sgarbi

Muitos pais chegam ao consultório procurando entender porque seu filho, mesmo sendo inteligente, tem dificuldades para aprender na escola.

Como exemplo, os pais descrevem filhos que desmontam e montam sozinhos os brinquedos para ver como funcionam, ajudam os pais no uso de ferramentas para algum conserto, são ótimos na prática de esporte, sabem tudo sobre seu time preferido, onde chegam fazem amigos...mas não conseguem entender os conteúdos escolares. Em alguns casos, as notas estão dentro da média, mas o esforço para mantê-las é enorme, custando várias horas de estudo, reforço escolar, aulas de assistência, provas finais, etc.

Começam os problemas que comprometem o desempenho na escola e afetam a autoestima.

São alunos que por descuido trocam os sinais dos cálculos e a subtração vira adição! Usam os dedos para contagem e se perdem. Tentam adivinhar se a conta é de mais, menos, vezes ou dividir. Vai que o chute dá certo! A leitura não tem fluência, e já que vai aos tropeços fica bem difícil compreender e interpretar. Ao escrever, a palavra cabelo vira “cadelo” e faca vira “vaca”.

Pulam linhas e folhas do caderno sem perceber. Demoram para terminar as tarefas e é comum que sejam os últimos da turma. Esquecem no armário da escola o caderno que usariam para estudar em casa.

São adolescentes que perdem o prazo para a entrega dos trabalhos. Não conseguem organizar o tempo e “enrolam” para começar as tarefas. Aí, quando se dão conta, o tempo passou e já está muito tarde...motivo de correria e prejuízo na certa!

Alguns desses jovens estudam muito, mas na hora da avaliação “dá um branco” ou têm dificuldade para expressar suas respostas por escrito. Outros não sabem estudar sozinhos. Ou não gostam de estudar e resistem, acreditando que já fazem muito assistindo as aulas.

A verdade é que ser inteligente não garante bom desempenho acadêmico.

Quando recebo no consultório uma criança ou adolescente com dificuldades para a aprendizagem, em geral me deparo com bons níveis de desempenho intelectual.

O fato pelo qual esses alunos são inteligentes mas ainda assim têm baixo rendimento escolar, depende fortemente da qualidade no uso de cada uma das funções neurológicas que compõe a inteligência. De quais estratégias utilizam para a solução de diferentes problemas, de como recrutam elementos de experiências anteriores para usar em novas situações, da capacidade de criar alternativas de resposta para diferentes desafios cognitivos, das habilidades de memória, atenção, percepção, linguagem, raciocínio, compreensão, motivação, capacidade de enfrentar frustrações e de resiliência, entre outros.

Aprender a andar de bicicleta, fritar ovos, jogar futebol, ajudar nas compras do mercado, combinar atividades com os amigos, assistir filmes atentamente...em geral trazem em si mesmos o amor e o desejo de aprender. São aprendizagens com significado emocional e na maioria das vezes recrutam funções cognitivas diferentes dos desafios da escola.

A aprendizagem acadêmica é sistematizada, numa sequência que independe da intenção do aluno, de suas competências ou áreas de dificuldade. Exige muitos recursos da inteligência e requer capacidade de abstração crescente.

À medida que passam os anos escolares, a criança vai substituindo o material concreto por habilidades mentais mais complexas. Nos primeiros anos, por exemplo, ao estudar sobre plantas, as crianças manuseiam folhas, flores e caule. Já o adolescente, ao estudar sobre o Egito precisa abstrair as informações sobre o modelo econômico e religioso predominante. Está agora no plano das ideias.

O pensamento abstrato passa a ser exigido cada vez mais. E com ele, a formação de conceitos verbais, raciocínio lógico, sequenciamento, memória de curto e longo prazo, velocidade ao processar as informações, capacidade de manter o foco de atenção, fluidez da inteligência, etc.

Em alguns casos, o aluno tem esses recursos cognitivos, mas há um déficit na capacidade de identificar quais estímulos são prioridade. Desta forma, dá atenção ao barulho da rua, à música que vem à cabeça e o professor explicando a matéria vai ficando longe...longe...tão longe que quando chega a hora de fechar a apostila não deu conta de fazer as atividades. Em outros casos, pode haver dificuldade para a inibição dos impulsos. Então, o aluno levanta toda hora do lugar e fala sem parar porque o cérebro não consegue regular esses impulsos (exceto os casos de indisciplina, onde a questão é diferente da que estamos tratando aqui).

O primeiro passo para ajudar seu filho é identificar a causa dessa dificuldade e qual o grau de sofrimento ou stress envolvido. Neste caso, procure um profissional de sua confiança para realizar o diagnóstico das áreas envolvidas na aprendizagem. O diagnóstico deve contemplar a avaliação da inteligência(entre outros recursos), que só poderá ser realizada pelo psicólogo ou neuropsicólogo habilitado para isso. Um profissional sério e responsável indicará as melhores intervenções, aumentando as possibilidades de sucesso e preservando a autoestima desse jovem!                                           

Por Fátima Sgarbi - CRP 08/04114